Eu não quero voltar ao corpo de antes
Eu sempre fui magra e ainda assim já fiz todo tipo de dieta. Dieta da lua, líquida, lowcarb, passando por ingestão de diuréticos e laxantes.
Gostar do meu corpo, mesmo sendo uma mulher dentro dos padrões, foi um processo construído com muita leitura, terapia, conversa, meditação e paciência.
No início da gestação, o Instagram me sugeriu um post patrocinado com dicas para voltar ao corpo de antes da gravidez. Bloqueei a conta e denunciei o conteúdo como ofensivo. Além de agressivo, achei desrespeitoso com o caminho que venho trilhando até aqui.
“Voltar ao corpo de antes da gravidez” não existe, porque, ao final da gravidez, eu não serei a mesma de antes. Serei mãe, serei uma mulher que viveu uma gestação, serei a mulher que observou, maravilhada, cada mudança: quadril expandindo, peitos aumentando, pele esticando ao limite. A gravidez foi a força que me faltava para descartar de vez toda e qualquer tentativa de controle sobre meu corpo.
Outro dia, salivei diante de um pedaço de picanha, eu que não ligava muito para carnes vermelhas. Teve dias em que eu desejava uma feijoada às 10h da manhã. Era meu corpo, sábio, lembrando das carências. O exame clínico, dias depois, me mostrou a anemia.
O corpo sabe tudo. É vivo e poderoso. Não é uma peça de museu, imutável e passível de admiração. É parte do que eu sou e, como eu mudo, ele muda comigo. Quando fico ansiosa, as costas doem, eu como mais e o peso aumenta. Quando engravido, ele expande, acolhe, avisa sobre os nutrientes necessários.
Meu corpo é parte de mim e é, também, memória do que eu vivo. Algumas pessoas arriscam o elogio: “você nem engordou, só ganhou barriga”. Eu sei que a intenção é boa, mas eu não preciso desse tipo de mensagem de conforto, não mais. Peitos, quadril, pernas, pele, tudo mudou, sim, não foi só a barriga e eu nunca me senti tão bonita, tão poderosa. Nada vai ser como antes e se quilos a mais seguirem comigo daqui em diante, está tudo bem, superemos a gordofobia, vamos deixar de lado esse elogio doentio à magreza, vamos respeitar as histórias que os corpos contam. Cabe tudo nesta imensidão de quem eu sou.
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