João e Maria

Carolina Bataier
1 min readJun 23, 2022

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Minha bisavó tinha a cor

das balas de café

que enrolava

com as pontas

dos dedos

no papel manteiga

e guardava num pote

perto de outros doces:

de leite, de abóbora

cocada.

As flores do vestido

de abotoar

estufavam sobre

o corpo

rechonchudo

como as rosas do jardim

gordas

coloridas

iluminadas por gotas d’água

na chuva do esguicho

da mangueira

nas manhãs

de sol.

Os gestos

pequenos

cabiam bem

na casinha de madeira

dividida com Fulano

o gato dos olhos verdes

estirado na janela da cozinha

enquanto ela remexia as panelas e

assoviava parecendo

um canarinho.

No dia do velório

Fulano deitou

de barriga para cima

debaixo das roseiras

as flores sem brilho d’água

mas ainda rechonchudas

igual minha bisavó

dormindo no caixão.

Minha mãe

na pontinha dos pés

alcançou a lata

de cima da geladeira

me deu três balas e falou

– vá lá fora brincar com o gato.

Entre as árvores,

João e maria

fizeram uma trilha

com migalhas de pão

mesmo assim

se perderam

e chegaram a uma casa

feita de doces

– a professora contou –

e eu sabia

quem morre no final

é a bruxa.

*

*A imagem que ilustra este post é uma reprodução de Rosebush, do pintor austríaco Gustav Klimt

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Carolina Bataier
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